Quando o RJAAR começou a ser criado, levantaram-se vozes criticando a legislação, apelidando a mesma de Lei dos Eucaliptos. No fundo, segundo os mais críticos, a lei facilitava a cultura do eucalipto e complicava a cultura das restantes espécies. Para nós, o ponto essencial do RJAAR, e do qual poucos falam, é que pela primeira vez, para qualquer obra florestal havia um técnico responsável pela arborização proposta e uma técnico que analisava essa proposta e que a aprovava ou não, nas condições propostas. E certamente do parecer dos dois técnicos – o proponente e o analista, nasceria uma área arborizada como deve ser. De imediato se colocou sobre a mesa a incapacidade da Autoridade Florestal Nacional para fiscalizar se o projeto/carta de intenções era ou não cumprido. E a falta de capacidade, no nosso país, dá origem a “legislação preventiva”. Legislação preventiva é aquela que proíbe sem qualquer justificação técnica, como não se consegue fiscalizar, proíbe-se.
Contudo, uma lei é algo que se pretende estável, para produzir efeitos e deve ter uma justificação forte para ser produzida.
A proposta de alteração do RJAAR é um desses casos. Alguém assumiu num programa eleitoral que era necessário travar a expansão do eucalipto e a solução encontrada foi realiza-lo através da alteração do RJAAR. O problema é que tal não tem qualquer base técnica. A nossa floresta de eucalipto encontra-se num estado, em que muitos povoamentos, porque já ultrapassaram há muito o termo de explorabilidade, deveriam ser substituídos, por outras espécies (à semelhança da rotatividade de culturas utilizada na agricultura), mas para isso haveria que arborizar novas áreas, aptas para a espécie por forma a garantir que a produção nacional não baixa, como tem acontecido com a produtividade nos últimos anos e para que haja matéria-prima suficiente para abastecer a indústria, que constitui um dos principais alicerces do sector florestal do nosso país e cuja expansão envolveu dinheiros públicos, por se achar que é um sector prioritário.
A ANEFA não pode pois concordar com o teor principal desta alteração que consiste na interdição de acções de arborização com espécies do género Eucalyptus. Para além de ser uma espécie de grande importância na economia nacional, não faz, na nossa opinião, sentido serem agora proibidas as arborizações, tendo em conta os investimentos fabris recentes, que foram financiados com dinheiros públicos e conduziram a uma maior capacidade fabril, a que está necessariamente associado um aumento do consumo de matéria-prima. Estes investimentos foram feitos com base na utilização de uma matéria-prima que não existe (e já se sabia disso na altura, embora houvesse a expectativa de poder vir a existir) em quantidade suficiente e para o qual é necessário mais área florestada nas estações adequadas à arborização com essa espécie. Será que já as esgotamos todas? Num quadro de recessão de área florestal, nomeadamente a produtiva, seria importante incentivar a recuperação de áreas abandonadas e incultas com arborizações das espécies mais representativas em Portugal e melhor adaptadas e onde dever-se-á incluir, naturalmente, o eucalipto.
Existem terrenos rurais sem qualidade para a produção agrícola ou de espécies mais exigentes. Não seria melhor para o ambiente a utilização desses solos para a arborização com espécies florestais, entre as quais o eucalipto?
Existe área com condições para a produzir e procura-se impedir o mesmo sem qualquer critério técnico, mas apenas político. O ordenamento florestal deve assentar em critérios técnicos, objetivos que tenham em conta os três pilares da sustentabilidade – ambiente, económico e social. Não se assiste a uma situação desta em mais nenhum sector. Existe capacidade técnica suficiente no terreno para de uma forma responsável elaborar, analisar e aprovar projetos que garantam essa sustentabilidade dos ecossistemas. Perguntamos se no sector agrícola existe alguma cultura que seja proibida por decreto lei? O impacto social de uma medida como esta que colocará em risco o abastecimento de uma das principais industrias florestais poderá vir a ser de grande dimensão.
E esse é um risco que facilmente se pode evitar através da competência dos técnicos que elaboram, analisam e aprovam os projetos de arborização. A própria evolução dos ecossistemas enquanto sistemas dinâmicos poderá obrigar a repensar toda a estratégia das diferentes fileiras florestais e o condicionamento à arborização com uma determinada espécie poderá colocar em risco, nessa altura, pela rigidez e estabilidade que um sistema legislativo implica, o próprio equilíbrio e sustentabilidade do ecossistema.
Numa altura em que nos deveríamos preocupar com a produtividade dos nossos ecossistemas florestais, com produtos lenhosos e não lenhosos, para dessa forma convencermos os produtores/investidores a investir no “ativo florestal”, garantindo dessa forma a sua sustentabilidade associada a uma gestão profissional, opta-se por legislar a proibição de plantação de uma espécie para a qual existe utilização, colocando em risco toda uma cadeia de empresas e funcionários que dependem da mesma. A ANEFA não é a favor nem contra qualquer espécie, desde que a mesma se adapte às condições existentes e tenha uma utilidade económica que garanta a sua sustentabilidade, enquanto povoamento florestal. Politicamente seria mais importante que nesta altura se procurasse uma solução para o problema do pinheiro bravo, cuja exportação é praticamente impossível e a sua arborização evitada por todos, desde o viveirista ao produtor florestal. E em relação à dimensão da propriedade de que tanto se fala, existem propriedades de pequena dimensão muito produtivas, porque são bem tratadas, o proprietário tem dinheiro suficiente para investir nelas, enquanto outras de dimensão “com escala”, como se costuma dizer, se encontram muitas vezes ao abandono, pois o investimento que é exigido para obter a produtividade semelhante ao da pequena propriedade é de tal ordem, que o proprietário ou não possui recursos financeiros para o fazer ou simplesmente acha que o risco associado ao investimento é muito elevado. Está na altura de nos deixarmos de refugiar nesse problema para nada fazer, os problemas existem, temos de encontrar soluções para viver com eles.